domingo, 15 de março de 2009

A DÉCADA DE 1930: O MITO DO ETERNO RETORNO?

A DÉCADA DE 1930: O MITO DO ETERNO RETORNO?

«Esta tendência imperiosa de fazer mal pelo próprio mal não
admite análise, nem solução com elementos posteriores. É um
impulso radical, primitivo, elementar.»
Edgar Allan Poe, The imp of the perverse

O ano de 1930 marcou o início de uma década, considerada das mais complexas e sangrentas da História Mundial. Caracterizou-se por inúmeros conflitos políticos e crises económicas que culminariam na Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e no Holocausto.
Tudo se iniciou em Outubro de 1929, quando as cotações da Bolsa de Nova Iorque caíram em flecha, influenciando toda a economia europeia. O crash de Wall Street influenciou sobretudo a Alemanha, que em 1932 tinha seis milhões de pessoas no desemprego. Aproveitando-se da crise económica e das fragilidades daí decorrentes, Hitler e o partido nacional-socialista, assumiram o poder.
Esta conjuntura político-social de crise favorecia a eclosão de movimentos totalitários anti-democráticos ou ditaduras.
Na Europa surgiram vários ditadores: Salazar em Portugal, Franco em Espanha, Mussolini na Itália, Hitler na Alemanha e Estaline na antiga União Soviética.
Em Portugal, nesta década, verificou-se uma taxa de suicídio mais elevada do que nas posteriores, como se pode comprovar pelas estatísticas do INE,[1] de 1930 a 1983.
1930 - 10,2 1956 - 10,1%
1934 - 12,2 1960 - 8,6%
1937 - 10,6 1967 - 9,9%
1939 - 12,8 1970 - 8%
1943 - 8,9 1979 - 9,6%
1947 - 10,6 1980 - 7,4%
1955 - 9,2 1983 - 9,7%
Em 1930, como podemos verificar, a percentagem de suicídios foi de 10,2%. Florbela Espanca (1894-1930), e Francisco Stromp (1892-1930) foram duas das personalidades portuguesas que entraram nesta estatística.
No ano de 1939, data de início da Segunda Guerra Mundial, registava-se a taxa de suicídios mais elevada.
Iniciou-se, a 21 de Janeiro de 1930, em Portugal, o 101º Governo interino, do General Domingos de Oliveira, que durou 896 dias, tendo, como ministro das Finanças, António de Oliveira Salazar.
Em 30 de Julho, foi criada a União Nacional; Salazar, como ministro, fez um discurso intitulado Princípios Fundamentais da Revolução Política; nele criticou “as desordens cada vez mais graves do individualismo, do socialismo e do parlamentarismo, laivados de actuações internacionalistas.”[2]
Fernando Pessoa criticou este “relatório falado, ou bois depois do carro, um apanhado, aliás muito lúcido e lógico, de princípios políticos já conhecidos” e observou que “ao público, ou a qualquer pessoa que pareça público não se pode dizer, embora melhor, senão o que ela já sabe (…).[3] Defensor da Maçonaria, Pessoa votava uma forte oposição a Salazar.
Verificámos, sem muita surpresa, que o discurso salazarista, se assemelhava ao de Hitler, proferido em 1928, do qual apresentamos alguns excertos: “ (…) o nosso povo deve ser liberto do internacionalismo sem esperança e sem ordem, e formado deliberadamente e sistematicamente por um nacionalismo fanático. (…) arrancaremos o nosso povo ao absurdo do parlamentarismo, ensinando-o a combater a loucura da democracia e a reconhecer a necessidade da autoridade e do comando.”[4]
Não foi por acaso que Freud escreveu “O mal-estar da civilização”, em 1930, ano em que Hitler assumiu o comando das Forças Armadas alemãs.
Como se pode concluir, a década de 30 caracterizou-se pela hegemonia dos génios da perversidade, que contribuíram, de forma insana, para o aparecimento de ditadores, e, sobretudo, de muitas vítimas da sua megalomania.
C. M. Gil
[1] Instituto Nacional de Estatística. Acedido em 10 de Julho de 2008, em http://www.ine.pt
[2] In Anuário 1930, acedido em 10 de Julho de 2008, em maltez.info/respublica/portugalpolitico/acontecimentos/1930.htm
[3] Idem
[4] In Frédéric Delouche, História da Europa, Coimbra, Editorial Minerva, 1992 apud Walther Hofer (obra colectiva) Der Nationalsozialismus, Dokumente 1933-1945, Frankfurt

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