sexta-feira, 10 de junho de 2011

Tecidos Impiedosos.

Ninguém é de ferro, na verdade, somos feitos do nosso material, ADN ou lá como lhe chamam, informação e genética, quem diz que só a vida faz as pessoas não está correcto, a Natureza também tem a sua mão, a vida não existe simplesmente, cria-se.

À nossa volta criamos a nossa pele da maneira como as pessoas a captam, ou seja, a nossa formação enquanto indivíduos e seres humanos, seres racionais e pensadores é feita pelo que nos inculcam de valores a pensamentos e a partir de certo ponto nós desenvolvemo-nos de dentro de nós mesmos e tornamo-nos em nós próprios, não só física como mentalmente (a psique é a única coisa que somos incapazes de alterar).

Estes nossos pensamentos, palavras soltas que se juntam e definem a qualidade que pretendemos para a nossa vida e a dos outros são a camada que se fortalece a cada dia que passa e dependendo da nossa sapiência: há humanos feitos de meros tecidos, enquanto outros são práticos diamantes. E eu não sou um tecido, muito menos um diamante, a cada palavra que aqui sangro perco parte da minha matéria, desfaço a barragem da mentalidade e os cristais da minha política interna nadam no lago do meu cérebro.

Há quem force as palavras e esses arquétipos não chegam a pensamentos, sonsas conversas feitas do que se gosta de ouvir, a popularização de mentalidades extermina os restantes pingos de noção que creio ainda existir na humanidade.

Não preciso de outras línguas para expressar o que o meu povo não quer dizer: a cultura desce a pique e não  a vou conseguir voltar a elevar sozinho. Uma língua é uma cultura, sim, mas então e que uso fazem dela se não sabem o que dizem? Falo de inteligência e insulto os que não têm medo das barbaridades que temem se até eu enquanto aqui choro pelo que vocês ignoram tenho medo do que se tornará este texto. Um insulto? Uma marca? Importante nada, carece o vago que os cépticos tanto anseiam:

"O mundo está bem assim, vou continuar a espezinhá-lo a cada passo. A criminalidade aumenta e é mentira do governo, o dinheiro decresce mas vou comprar um carro e uma casa de férias, os meus vizinhos são homossexuais à sua frente finjo-me, por detrás digo mal deles, na verdade tenho curiosidade, consumo drogas mas não quero passar de um rebelde."

Mas a lei não é só a justiça governamental, a lei são os limites que impomos a nós mesmos e as nossas mentiras são os nossos maiores caprichos, o julgamento é feito por nós mesmos, estamos mal quando nos julgamos e sentimos mal com o que fazemos, mas até à morte não devemos redimir-nos.

Parece que não falo a vossa língua, o meu cérebro veio do inexistente, como posso só eu estar mal neste mundo, se para vocês tudo menos o vosso espelho está errado.

Cortando as nossas próprias pernas para andar, nunca seremos feitos de tecido e muito menos de diamantes - se eu não existir para vomitar para cima de vocês a vossa "verdadeira" mentira, nunca estarão vocês acima do que são, viveremos sempre pobres de espírito a criticar os que têm mais que nós por viverem livres enquanto vivemos presos, desejosos e mal-educados.

Nunca vou cuspir a língua que tenho entre os dentes antes de lamber o cérebro e falar pela mente. 

Tiago Filipe

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